segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Minha saga do Hexa

Em 1992 eu tinha apenas 2 anos de idade, não sabia nem o que era futebol, logo não vi o Flamengo ser penta campeão brasileiro naquele ano. De lá pra cá adquiri a paixão pelo futebol e o amor incondicional pelo Flamengo. Nesse intervalo de 17 anos, eu sofri, chorei, me decepcionei, me iludi, mas acima de tudo, amei. Claro que não houve só sofrimento nesse longo intervalo de tempo, também vibrei bastante com conquistas estaduais sobre nossos queridos rivais, com a conquista da Mercosul, da Copa do Brasil e com fugas de rebaixamento, como a de 2005 que foi muito parecida com a atual do Fluminense. Enfim, isso é um mero contexto para dimensionar a importância do dia de ontem. Dia 06 de dezembro de 2009.
A saga começou no dia anterior, embarcando de Guarapari para o Rio numa van. Apertado e com pouca comodidade, sem dormir uma hora sequer de sono e sem ter a certeza de conseguir o ingresso. Mas nada que me desanimasse. Ao chegar no Rio já dava para perceber como estava o clima da cidade, uma multidão rubro-negra dominava as ruas desde cedo, a Gávea estava insuportavelmente lotada. Partimos cedo para o Maracanã, ao meio-dia já estávamos lá com a promessa de que às 13h os ingressos estariam na mão. Nessa hora os arredores do Maracanã já estavam tomados de rubro-negros e as filas para entrar no estádio já eram consideravelmente grandes. Deu 13h, 14h, 15h e nada de ingresso. As filas só aumentam, muita gente consegue invadir, mas a Polícia Militar tenta conter a multidão com suaves cacetadas, muitas delas em inocentes, sem falar no spray de pimenta na cara da galera só para abrir passagem para o onibus do Grêmio chegar. Enfim, lamentável. Voltando à minha saga, o ingresso de nossa excursão não aparecia. Por volta de 16h30 o desespero bate à porta, sento no meio-fio em frente ao maior estádio do mundo e ouço a torcida cantando. Um filme de 17 anos me vem à mente, aquele era sem dúvidas o dia mais importante de minha vida de torcedor e eu estava apenas a alguns passos de vivenciá-lo. O ingresso chega na minha mão faltando apenas 10 minutos para o início da partida, é preciso correr porque as tentativas de roubo eram iminentes. Coloco o ingresso na roleta e ele é rejeitado, na hora pensei que era falso. Tentei na roleta do lado e "ufa!" consegui entrar. Olho no relógio do celular, 16h57. Subo a rampa numa explosão de felicidade e ouvindo a festa da torcida, o Flamengo entrava em campo. Não havia muito espaço nas arquibancadas. Consigo me amontoar em uma das entradas das arquibancadas amarelas e me uno à 90 mil apaixonados pelo Flamengo. Olho para o campo e vejo que já está tudo praticamente pronto pro início do jogo. Cheguei na hora certa. Ao soar o apito do juiz, parecia ser o fim do meu sofrimento, era a hora de comemorar. Que nada, tem que ter sofrimento até o fim, se não, não é Flamengo. O gol do Grêmio cala o Maracanã e deixa os torcedores atônitos, um olhando para o outro sem ter o que falar, buscando explicações. O time precisa de nosso apoio, mas a ficha pareceu ter caído apenas uns 30 segundos depois, quando o hino do mais querido foi entoado pelas 90 mil vozes. As notícias que o telão nos trazem não são agradáveis. O gol de David trouxe um certo alívio, havia a certeza de que o time iria virar aquele jogo logo logo. Acaba o 1º tempo, torcedores apreensivos. O 2º tempo vai se desenrolando e nada de gol. Minhas orações começam a dominar meus pensamentos junto com o filme de 17 anos que volta a ser exibido. Eis que surge um escanteio, e como em todas as bolas paradas, todo mundo fala "É agora". Nosso guerreiro mais talentoso e ídolo de 8 anos atrás que voltou para ajudar a realizar o nosso sonho ajeita a bola. A caminhada dela é longa, os olhos não piscam. Um de nossos guerreiros mais humildes, símbolo fiel de nossa torcida, salta e desvia a bola, vejo a rede balançar no cantinho. Naquele momento, o filme de 17 anos para de ser exibido em minha mente. O que começa a ser exibido é a maior explosão de felicidade que eu já vivi. O grito de gol não se une apenas às 90 mil vozes do estádio e sim às 35 milhões de vozes rubro-negras espalhadas pelo mundo. As pessoas começam a se abraçar enlouquecidas, pessoas que você nunca viu na vida, mas que compartilham do seu sentimento. Era chegada a hora de começar a festa, como diz o novo hit das arquibancadas rubro-negras. O Maracanã tremia, tive a impressão de estarem passando algumas ondas de concreto nas arquibancadas. Mais alguns minutos de sofrimento até o apito final. Aí suor e lágrimas se misturaram, mais abraços foram partilhados e o grito que veio do fundo da alma ecoou no Maraca: "HEXA CAMPEÃO! HEXA CAMPEÃO!" O alívio tomou conta de mim, parecia que um peso do tamanho do Maracanã estava nas minhas costas e a partir daquele momento eu o jogava fora. E ainda houve tempo para se emocionar mais. Em meio à multidão das arquibancadas, ia se abrindo um espaço para alguém passar. Era um jovem carregado no colo por dois rapazes. O jovem aparentava ter alguma deficiência física e mental. Atrás dele estava uma mulher, provavelmente a sua mãe, carregando as suas muletas e chorando muito. O menino carregado vestia vermelho e preto, sorria muito e gritava "HEXA! HEXA!" Não deu pra segurar as lágrimas, ali eu tive mais uma demonstração do que o Flamengo representa para tanta gente.
De alma lavada e com a faixa no peito, era a hora de ir embora. De se despedir do templo sagrado, da casa rubro-negra, o Maracanã. Em torno dele, um mar em vermelho e preto tomava as ruas. Felicidade propagada pelo ar. Era a hora de voltar pra casa. Eu e meu primo brincávamos que depois de todo aquele sofrimento para entrar no estádio e depois durante o jogo mercia que escrevêssemos o livro "A Saga do Hexa". O detalhe é que a saga ainda não tinha chegado ao fim, no caminho da volta, fomos parados pela fiscalização da Polícia Federal em Campos que fez a gente andar a pé um certo trecho da rodovia para uma hora depois liberar o veículo. Nada que me fizesse perder a paciência e me arrepender. Eu faria tudo de novo e sofreria muito mais.

Tudo pelo Clube de Regatas do Flamengo.

Campeão Brasileiro em 1980, 1982, 1983, 1987, 1992 e 2009.

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